Das Águas à Cidade

DAS ÁGUAS À CIDADE
Depois da avenida, viu –se o muro, e então de repente
Não se viu mais nada…

Apagaram, tudo
Pinturam tudo de cinza
Privaram, tudo
Só ficou no muro tristeza e tinta fresca
Por que o construíram? Lamenta o pai que abre o vidro do carro para comprar bala, enquanto aguarda na fila do estacionamento a beira do cais.
O que há atrás do muro? Indagam as crianças que vendem o produto no sinal.
Atrás do muro há a esperança por dias melhores, por espaços mais justos, há o respeito com outras espécies e seus ecossistemas,
Há a convicção na ciência, e consequentemente no aumento das mudanças climáticas e seus danos.
Há, acima de tudo, inúmeras possibilidades, há a chance de fazer algo para toda a população local, todas as classes sociais, que seja justo e convidativo, que melhore as condições de vida, algo já em extinção nesses tempos modernos.
Há o desafio de lidar com problemáticas reais e a partir delas criar soluções que tenham relevância para o futuro
para então virar a página dessa história
e enfim, escreve-la nas margens das águas
que irão devolver à cidade, o seu porto alegre.
Se antes ao avistar o cais da cidade de Porto Alegre a única preocupação era de contempla-lo ao máximo a partir das águas e sentir a esperança de vida nova, hoje ao chegarmos na capital somos recepcionados por viadutos, confusas pistas e degradação. Trocamos os sons dos navios por buzinas; o que antes representava novas perspectivas, novos mundos a conhecer, hoje evidencia uma sociedade impaciente, grosseira e individualista.
O Cais Mauá é o reflexo dessa sociedade, que está há sete anos sem dar acesso à essa orla que por direito é da cidade. Que aprovou um shopping center no lugar de um parque. Que é insensível ao aprovar duas torres que se contrapõem aos pequenos armazéns. Em uma cidade que está sedenta por espaços públicos, mas não nota porque temos dez shoppings centers completamente iguais para irmos.
A maioria das pessoas, quando pensa na Avenida Mauá pensa em carros, ônibus, motos conformando engarrafamentos; já esse trabalho ousa pensá-la como oportunidade. Como o elo que fará a ligação da cidade com a orla, por mais que sua função hoje represente o contrário. Para repensar as relações dos seus elementos, reimaginar formas de conexão e redefinir usos para que o Cais volte a ser usado pelo cidadão. Para que as memórias das novas gerações tenham relação com o rio, ensinando-as a valorizar o patrimônio e os seus espaços de convivência.
Pois são através desses que as diferenças da sociedade diminuem, que diferentes classes convivem juntas e se conectam pelo seu lado mais humano.
É a partir de um patrimônio público, o Antigo Frigorífico, que será irradiada toda essa força para revitalização. Não seria aceitável, tratar somente do objeto arquitetônico e não dá-lo acesso, não responder como chegar até ele. É através dessa inquietude que se decide trabalhar desde escala macro urbana até a escala da edificação.

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